quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Eleições na Catalunha

A situação na Catalunha, depois das eleições de 21 de Dezembro, está completamente embrulhada. Em número de deputados, os independentistas têm maioria absoluta (70 lugares num parlamento de 135). Contudo, os independentistas apenas têm 47,5% dos votos. Isto parece indicar que os não independentistas têm, em caso de um hipotético referendo, uma maioria garantida. Nem isso, porém, é claro. Os não independentistas somam 50,9% dos votos. Contudo, neste bloco estão contabilizados os 7,45% do CatComú-Podem, o Podemos catalão e os seus aliados, que parecem ser bastante esquivos. Nada garante que parte destes votos, num hipotético referendo, não se desloque para o independentismo. Em resumo, uma salsada das antigas, na qual o senhor Rajoy, com os seus tiques marialvas, sai maltratado. Não resolveu nenhum problema e talvez tenha criado alguns. O não independentismo deve ter atingido o seu pico no dia de hoje, a partir de agora o mais previsível é diminuir por falta de comparência. Do ponto de vista democrático, só um referendo legal poderá resolver a situação. Ora, para isso é necessário mexer na Constituição e na linguagem arcaica e quasi-falangista que transparece no corpo legal espanhol. Será que os fantasmas espanhóis o vão permitir?

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Polónia e Estado de direito

O que a Polónia aprovou é um ataque aos princípios fundamentais do Estado de direito. Por certo, não deve haver governante que não gostasse de controlar o aparelho judicial. Isso, porém, seria destruir não apenas o sistema democrático mas também o direito básico fundamental a um julgamento justo e imparcial. Seria trazer o inferno para a Terra. O que separa um Estado de direito de um Estado absoluto é, mais do que a existência do pluralismo político, a clara separação entre o poder executivo e o poder judicial. Perante a decisão polaca, vamos ter agora a possibilidade de averiguar, na prática, as crenças que norteiam as elites políticas europeias.

domingo, 17 de dezembro de 2017

Pancadinhas nas costas

Esta linguagem serve para quê? Todos nós temos o direito de julgar as agências de rating uma das dez pragas do Egipto. Pessoalmente, não lhes tenho particular estima. A questão, porém, é outra. De que me serve abominar com veemência e ardor - a líder do BE (ver aqui) é sempre veemente e ardorosa - essas terríveis entidades diabólicas, se depois a minha vidinha depende delas? Importante seria demonstrar que o país não depende do rating que essas agências malévolas lhe atribuem. Ora como o país parece que depende, como o BE e outros ainda não conseguiram explicar como podemos viver sem aquelas sentenças imorais que essas malditas górgonas se lembram de proferir a torto e a direito, o melhor é receber delas pancadinhas nas costas do que murros na cara.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Perdeu o faro

Será que António Costa perdeu o faro político que parecia ser a sua imagem de marca? Será que não passa de um adolescente que se entusiasma e diz qualquer coisa movido pela emoção? Não saberá ele, que anda há tanto tempo nisto, que qualquer palavra - ou até qualquer murmúrio - que saia da sua boca vai ser escrutinada até à exaustão? Por muitas razões que a economia lhe dê para rir e celebrar (até a Fitch o veio ajudar), ele, depois da devastação dos incêndios, terá de medir cada palavra que diz, cada expressão facial que apresenta. Um político não tem estados de alma. Um político que luta para manter o poder apresenta os estados de alma que os eleitores esperam dele. As coisas são o que são. Num ano em que morreram mais de cem pessoas em incêndios, devido aos quais o governo está sob forte escrutínio público, nem ao diabo lembraria vir dizer que 2017 foi um ano saboroso para o país. António Costa parece que ainda não percebeu uma coisa essencial para se manter no poder. Ele e o seu governo, em público, ou se mostram de luto, ou põem cara de enterro, ou fazem-se de mortos.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

A tradição de direita

Diz o doutor Rio: "O PSD não é um partido de direita nem é a direita, é um partido social-democrata e a social-democracia é ao centro, não é à direita nem à esquerda." Em primeiro lugar, Rui Rio está equivocado. A social-democracia sempre foi de esquerda. Que o antigo PPD se tenha dado o nome do PSD, isso não passou de um mero expediente. A social-democracia está ligada ao movimento operário e evoluiu de movimento revolucionário para movimento reformista, sem deixar de ter essa relação com o mundo do trabalho e dos sindicatos. Em segundo lugar, o centro pode ser conquistado sem necessidade de recorrer à tradição social-democrata. Em muitos países uma combinação de pensamento democrata-cristão e de pensamento liberal - por vezes, mesclado com pensamento conservador - tem tido capacidade de mobilizar o centro e fornecer alternativas de governo sólidas, muitas vezes mais atraentes para o eleitorado do que as alternativas social-democratas. Já era tempo em Portugal de nos deixarmos deste tipo de fogos de artifício. Portugal já tem demasiados partidos social-democratas (do PS ao PCP, passando pelo BE, todos têm programas de governação social-democratas). Não seria mau para a democracia que a direita tivesse alguma solidez ideológica. A cada um a sua tradição. E se a tradição da direita tem de ser inventada, ao menos que a invente fora do território da esquerda.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Veneno e sangue

Na decisão de transferir a embaixada dos EUA, em Israel, para Jerusalém, anunciada por Donald Trump, há duas coisas dignas de realce. Em primeiro lugar, o desdém por uma das virtudes políticas essenciais, a prudência. Em segundo lugar, o desprezo pelos sentimentos do mundo muçulmano, como se este fosse uma actor político menor ou mesmo inexistente. Menosprezar a prudência e dar razões para que o mundo muçulmano, sempre tão dividido, tenha uma causa comum significa o quê? Cada semente que é lançada no solo da história germina e acabará, mais tarde ou mais cedo, por ser árvore e dar frutos. Raramente, os frutos que nascem nessas árvores são doces. Por norma, são venenosos e sabem a sangue. 

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Má memória

É muito curiosa a contínua referência, pela militância social de direita, aos resgates feitos pelo FMI. A ideia que passa é que todos os resgates se fizeram por causa da má governação da esquerda. Esquece, por exemplo, que o resgate de 1983, feito pelo governo do bloco central, foi antecedido por uma longa governação da direita. De Janeiro de 1980 a Junho 1983, três anos e meio, a Aliança Democrática governou o país, deixando-o à beira do colapso e entrando numa crise política que, apesar da maioria na Assembleia, leva à queda do governo e à ruptura entre PSD e CDS. Uma direita com má memória.

domingo, 3 de dezembro de 2017

Desígnios

O dr. Santana Lopes, pessoa simpática e estimável, tem um grande desígnio, o do desenvolvimento do interior. Um desígnio talvez tão grande quanto era a paixão de António Guterres, outra pessoa simpática e estimável, pela educação. Como todos sabemos, as paixões são coisas que dão forte mas, felizmente, passam depressa. Ao fim de algumas paixões, até estas se tornam rotina e cansaço. E desígnios, dr. Santana Lopes, são paixões que nem paixões chegam a ser, por falta de energia. Seria melhor que o interior tivesse vontade e iniciativa para se desenvolver e os drs. Santanas Lopes – onde se incluem os candidatos do PSD e governantes do outro lado – poderiam estar mais tranquilos, sem ter a necessidade da profecia ou da promessa, nem afectar paixões que o corpo e o coração, por inadequação visível, não conseguem albergar.

sábado, 2 de dezembro de 2017

Como Deus

Na catequese, foi-me ensinado que Deus estava em toda parte e cuidava de nós. Não se pode dizer que as provas empíricas fossem sólidas, mas como essas proposições são matéria de fé, cada um fará com elas o que entender. Hoje em dia, porém, podemos dizer que Marcelo Rebelo de Sousa está em toda a parte. E há provas empíricas robustas. Foi visto num protesto de professores, em homenagens fúnebres a Belmiro de Azevedo e a Zé Pedro, sobre os quais teceu agradáveis palavras. Ainda teve tempo para ir ao Banco Alimentar, salvo erro, e para emitir opinião sobre a magna quaestio de Mário Centeno ir ou não para chefe do Eurogrupo. Não sei se, como Deus, Rebelo de Sousa cuida de nós, mas, como Ele, está em toda a parte. E nem ao sétimo dia descansa.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

1.º de Dezembro

Gosto de feriado do 1.º de Dezembro. Isto não significa que não goste de Espanha. Gosto e muito, mas gosto mais de não ser espanhol. Prefiro os defeitos dos portugueses aos defeitos dos castelhanos. Talvez seja por estar habituado a esses defeitos, mas a verdade é que os nossos, apesar de contra eles protestarmos todos os dias, há muito que não nos dão uma guerra civil, nem sustentam uma cáfila de senhoritos a fingir que têm voz grossa, como se tem vista do outro lado da fronteira com o triste caso da Catalunha. Por isso, estou obrigado perante os conjurados e o golpe ilegal do 1.º Dezembro, o qual pôs as coisas no devido lugar.

quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Mário Centeno

Ainda não consegui perceber o entusiasmo com a putativa ida de Mário Centeno para a liderança do Eurogrupo. Se até Jeroen Dijsselbloem conseguiu lá chegar, por que motivo um doutorado por Harvard há-de regozijar-se por tal hipótese? Depois, um português chegar a um cargo desses na UE é tão natural como um algarvio ou um ribatejano chegarem a ministros da República. Isso é motivo de excitação? Esta gente não tem mais nada para fazer?

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Ramalho Eanes

Hoje foi lançada uma biografia autorizada de Ramalho Eanes. Tenho uma apreciação globalmente positiva da sua acção política. Contudo, nem tudo foi luminoso. A história do PRD parece-me uma nódoa no currículo que ele deveria ter evitado. Exceptuando isso, não teria sido mau para a democracia portuguesa que as elites políticas que tomaram conta do país tivessem o respeito que o general sempre evidenciou pela res publica e pelos interesses do país. Hoje Portugal estaria francamente melhor e teria, apesar das vicissitudes internacionais, evitado a aventura da troika. E não há maior homenagem que um cidadão possa prestar a um antigo governante do que apontá-lo como exemplo cívico. Um dos grandes da nossa democracia.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Crony capitalism

Ver o arrufo entre o governo e o BE, sobre as rendas da EDP, como um problema interno das esquerdas é querer tapar o sol com a peneira. Independentemente do acerto da solução proposta pelo BE, o que ficou claro, mais uma vez, é a impotência, para não dizer cumplicidade, dos partidos do arco governativo perante os grandes interesses. O hooliganismo político que grassa nas redes sociais entretém-se muito com a divisão entre direita e esquerda. Na verdade, em Portugal, como em muitos outros países ocidentais, essa divisão é, na prática, fictícia. Governe a direita ou governe a esquerda, quem manda são os mesmos. Antes de haver espaço para um verdadeiro confronto entre projectos de direita e de esquerda é necessário limpar o terreno deste inaceitável conúbio entre política e interesses económicos. Só a partir dessa limpeza faz sentido discutir se a sociedade deve ser mais liberal ou mais social-democrata. Até lá, não passa de um crony capitalism, como se tornou a ver neste arrufo.

sábado, 25 de novembro de 2017

Cansativo

Não me comovem os ataques que a direita faz a esta iniciativa (ver aqui). Isto, ou coisa semelhante, é uma parolice que um qualquer governo de direita seria capaz de fazer. A parolice está democraticamente distribuída. O que não me deixa de espantar, contudo, é a insistência de António Costa, nos últimos tempos, em coisas estúpidas, sem qualquer benefício político e que têm o condão de dar assunto à oposição para fazer um drama. Do ponto de vista do cidadão, estas coisas são inadmissíveis. A oposição faz o seu papel e ainda bem. Há contudo, um outro problema. É uma certa cultura de novo-rico que se instalou nas elites governantes. Estão tão extasiadas com o terem chegado ao poder, que, ao assumi-lo, o cérebro fica toldado e acham que tudo é possível. Eu não sou favorável ao Estado mínimo, mas sou um adepto do Estado frugal. Gastar apenas no que é estritamente necessário e depois de grande ponderação. O António Costa não arranja pessoas normais e sensatas que o aconselhem? Por exemplo, alguém que perceba as consequências políticas negativas de cada uma das ideias geniais que afloram naquelas cabeças. Isto está a tornar-se cansativo.

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Um problema

O Islão é um problema. Não porque todos os adeptos dessa religião sejam terroristas ou queiram impor a sua religião a outros, mas porque existem grupos militantes que estão dispostos a tudo, mesmo a matar outros adeptos do Islão. Neste momento, o Islão militante é o principal problema do mundo. O assassinato, no Egipto, de fiéis sufi é revelador (ver aqui). Os sufi, um ramo espiritual do Islão, pela natureza da sua prática religiosa são os que estão mais abertos à aceitação da diferença e à tolerância. Para o Islão militante não há tolerância possível. A morte é a única lei que os rege. Se isto não é um problema, o que é um problema?

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

O pescoço a jeito

Os tempos não correm de feição a António Costa e ele também não ajuda. Tancos, os incêndios, a legionella. A lei de Murphy tomou-o de ponta e, como se sabe, qualquer coisa que possa ocorrer mal, ocorrerá mal, no pior momento possível. E assim se tem cumprido. Por outro lado, les compagnons de route estão apostados em que a route regional não se transforme em auto-estrada, e vão de criar uns quantos problemas ali mesmo onde a coisa dói, isto é, na função pública. Com o Murphy e os compagnons indispostos, o próprio António Costa e o governo decidiram pôr o pescoço a jeito. Não bastava a desorientação na segunda vaga de incêndios, como agora fazem, nem Deus sabe porquê, transferências avulsas como o Infarmed. Ainda não perceberam que, nas actuais circunstâncias, o melhor que o governo deve fazer é fazer-se de morto. Houve um momento em que parecia que havia ali alguém que pensava, mas ou reformou-se, ou emigrou para a Europa.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Agência Europeia do Medicamento

Quando se colocou a questão da transferência da Agência Europeia do Medicamento para fora do Reino Unido, devido ao Brexit, falou-se de Lisboa e das possibilidades que ela teria de ser escolhida. Isso desencadeou, em Portugal, uma campanha contra a candidatura de Lisboa. O governo, que tinha a obrigação de saber que o peso de uma candidatura do Porto era muito menor que o da candidatura de Lisboa, em vez de ser firme na sua intenção, cedeu ao vociferar de Rui Moreira. O resultado é que a agência irá ou para Milão, ou para Amesterdão, ou para Copenhaga (ver aqui). Como se percebe ficámos todos a ganhar.

domingo, 19 de novembro de 2017

A vociferação

Com a questão das progressões na carreira pelos professores, a esquerda enrolou-se sobre si mesma e, se não houver um módico de inteligência, está a preparar o caminho para o retorno em força da direita. Mesmo que o acordo entre governo e sindicatos de professores seja uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma, a vociferação de outros corpos da função pública representa um desgaste político contínuo para a actual solução governativa, desgaste que parece não ter fim à vista. O que se está a passar mostra os limites ideológicos dos grupos políticos que apoiam a actual situação. Por um lado, os partidos que estão fora do governo, continuam presos a lógicas particulares, incapazes de olharem para o país como um todo que tem de viver num ambiente que não determina e que é altamente ameaçador. Por outro, o partido do governo, dividido entre a responsabilidade perante a União Europeia, a falta de uma legitimidade política inequívoca e a leviandade que, desde há muito, é imagem de marca dos socialistas, mostra-se atarantado, sem saber que rumo tomar. A esquerda parece que ainda não percebeu que os grande problemas do país não são os rendimentos dos professores, dos médicos, dos militares ou da função pública em geral. E se não percebeu isso, não percebeu nada. A esquerda tem tido tudo na mão. Se falhar, não se pode queixar a não ser de si mesma. E se ela falhar, serão os seus eleitores, e não as elites políticas de esquerda, que pagarão duramente o falhanço.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Um paternalismo perigoso

Há dias referi que o papel de provedor do cidadão que Marcelo Rebelo de Sousa tem feito é útil. Referia-me a casos como os de Tancos ou da Legionella. Nestes e noutros semelhantes, isso é aceitável e benéfico. Outra coisa é comentar todas as decisões políticas do governo. As que lhe agradam ou as que lhe desagradam. Na prática, está a desenhar um paternalismo, em relação à governação, à oposição e aos cidadãos, que não é compatível com uma democracia liberal. Este paternalismo assenta numa coisa perigosa para a cidadania e para a democracia: a ideia de que a posição do PR é a verdade sobre um determinado assunto. Isso é aniquilar a democracia. Imaginemos que, no caso do prolongamento até 23 de Novembro do período crítico de incêndios, a decisão do governo gerava discórdia na oposição. O comentário de Marcelo Rebelo de Sousa aniquilaria de imediato o debate político e o papel da oposição. Condicionaria também a opinião dos cidadãos. Isto é perigoso.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

O provedor

Para lá do estilo, pelo qual não tenho particular admiração, e da visão ideológica que tem do mundo, que também não partilho, este trabalho de provedor do cidadão, que Marcelo Rebelo de Sousa está a fazer, é meritório. À sua maneira, um pouco histriónica, tenta colmatar alguns défices da nossa democracia. Por exemplo, a contínua tentação das elites governantes em não prestar contas, em deixar tudo o que é desagradável morrer como se não tivesse acontecido nada. Um Presidente da República não é um provedor do cidadão. Contudo, numa democracia como a nossa, onde a herança do autoritarismo aparece nos lugares mais insuspeitos, o papel não é inútil e acaba por proteger o regime de algumas tentações.

domingo, 12 de novembro de 2017

Debate político

O debate político em Portugal é miserável. Está cheio de casos, uns graves, outros anedóticos. Mas sempre e só casos. A nossa política não passa de uma casuística insana. Poder-se-ia pensar que isso se deve ao ardil dos políticos que fogem, para não perder votos, dos assuntos sérios como o diabo da cruz. Mera ilusão. A casuística e o anedotário, conjugados com a tonalidade da indignação, são as únicas ferramentas que a generalidade dispõe para arremessar ao outro lado. Um debate sério exige muito conhecimento, muito estudo e muito esforço. Ora, quem está disponível para tanta perda de energia?

sábado, 11 de novembro de 2017

Perguntem ao Putin

Nem percebo como isto não ocorreu aos responsáveis pela investigação da alegada interferência russa nas eleições americanas, que teria tido por finalidade eleger Donald Trump. Em vez de perderem tempo e dinheiro em investigação, perguntavam: Sr. Presidente, acha que os russos interferiram nas eleições a seu favor? Trump responderia: olhe, pergunte ao Putin. Ele dir-lhe-á a verdade e fica tudo resolvido. Não há nada como perguntar ao Putin (ver aqui)).

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Vichyssoise

Há coisas que nem Marcelo Rebelo de Sousa pode dizer. Todos sabemos que ele é muito afectuoso, nada num mar de ternuras e inclinações, e que lhe foge a retórica para a divagação familiar. Aquilo que, todavia, nem ao tinhoso do belzebu lembra, lembra ao actual Presidente da República. Entusiasma-se, entusiasma-se, e lá deixa sair alguma coisa que ou está escondida no recôndito da alma ou em que ele acredita como acreditava na vichyssoise que vendeu a Paulo Portas. Pródigo tanto no ditirambo como no encómio, perante a figura da esposa do Professor Aníbal Silva, não se conteve e nomeou-a, a posteriori, madrinha dos portugueses, pelo menos durante 20 anos. Temo que, se for convidado para alguma homenagem à senhora Lurdes Rodrigues, aquela que pastoreou os professores, no tempo do senhor Sócrates, ainda a designe como a mãe dos professores portugueses, se não mesmo o seu anjo protector. Às vezes, era melhor que o Presidente em vez de abrir a boca para falar fosse para introduzir uma colher de vichyssoise.

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

O desvelo

Confesso que o ministro Rodrigues, o rapaz que, segundo o organograma (nem sei onde foram inventar esta espécie de palavra) governamental, ocupa a pasta de Educação, embora tenha ouvido dizer que não passa de um heterónimo do secretário de Estado Costa, confesso, dizia eu, que ele não me interessa para nada. Não partilho a sua visão da educação (caso a actual visão seja a dele), não porque esteja em abstracto errada, não está, mas por outros motivos que não vêm ao caso. Fico, porém, perplexo pelo súbito desvelo de Assunção Cristas para com os professores e o ataque ao ministro, por este teimar numa ideia que o governo, onde a senhora pastoreou a Agricultura, pôs em prática com grande determinação e não pouca rispidez (ver aqui).

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Pressões

Enfermeiros, médicos, juízes e, agora, professores. O êxito de António Costa está a transformar-se nos ingredientes que começam a cavar a sua derrota e com ele a da esquerda. As contas de Mário Centeno têm feito milagres, mas o milagre só pode persistir dentro da frugalidade e da contenção da despesa. Depois dos fogos, esta pressão sobre o orçamento, a que se aliará a eleição de um novo chefe da oposição, começam a abrir caminho para o retorno da direita ao poder, mais depressa do que se pensa. Percebe-se que enfermeiros, médicos e juízes façam o que estão a fazer. São intocáveis, seja qual for o governo. Quanto aos professores, parece que ainda não perceberam o que lhes vai acontecer quando a direita voltar ao poder. Já se esqueceram dos últimos tempos do Crato. 

terça-feira, 7 de novembro de 2017

Revolução bolchevique

O que dizer dos 100 anos da tomada de poder pelos bolcheviques russos? A muita gente ocorrerá grandes encómios, a muita outra ferozes censuras. A mim ocorre-me que a facilidade com que os comunistas russos tomaram o Palácio de Inverno é idêntica àquela com que saíram de lá. O mundo nunca deixa de surpreender.

domingo, 5 de novembro de 2017

O fastio e o enjoo

Por desfastio, alguém nos EUA lembrou-se de descarregar uma arma para entro de uma Igreja Baptista. Vinte e sete mortos. Também para não enjoar, foram encontrados investimentos, em offshores, da rainha Isabel II e de alguém ligado à administração Trump. Como se vê, há múltiplas e criativas formas de combater o fastio e o enjoo. Sob o Sol - ou a Lua - nada de novo. Talvez, ao contrário do que que pensava o velho William, não haja mais coisas entre o céu e a terra do aquilo que pode imaginar nossa vã filosofia. Talvez não. O pior, porém, é o fastio e o enjoo.

sábado, 4 de novembro de 2017

Ferramentas

O processo de dessacralização das sociedades ocidentais foi acompanhado por um processo de sacralização das ideologias políticas. Esquerda e Direita são vistas, pelos respectivos adeptos, como espaços sagrados, nos quais cabem, por certo, diversos credos e diferentes liturgias. Uma leitura racional da dicotomia política mostra-nos, porém, que Direita e Esquerda são meras ferramentas que certas sociedades, como um todo, usam com a finalidade da autopreservação e da persistência no tempo.

O carácter sacral desses espaços devia chamar a atenção, de quem olha racionalmente a questão política, para o investimento que a espécie faz, em certo tipo de sociedades, nessa organização dicotómica. A sua sacralização não é outra coisa senão a criação de uma ilusão que visa preservar essas ferramentas. No entanto, essa ilusão revela uma outra coisa.

Direita e Esquerda não têm, por si mesmas, qualquer valor intrínseco. O seu valor é meramente instrumental. São ferramentas que os cidadãos, enquanto comunidade, usam para regular a sua vida comum. Talvez a maior parte dos cidadãos necessite da ilusão, necessite de perceber na Direita ou na Esquerda um valor sagrado. Se queremos, porém, pensar o fenómeno político, devemos deixar de lado a ilusão e olhar Esquerda e Direita como o esquadro ou o formão dos carpinteiros. Meras ferramentas a usar. 

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Jerónimo de Sousa

Não estará longe o dia em que o PCP terá de substituir Jerónimo de Sousa à frente do partido. Não será um pequeno problema. É verdade que os comunistas vivem fixados na imagem do Dr. Álvaro Cunhal, a quem, talvez para sublinhar uma proximidade que nunca existiu, chamam apenas Álvaro. No entanto, Cunhal que nem dos comunistas foi próximo, pelas suas características psicológicas, pelo seu ar aristocrático e distante, pela sua preparação política e pela sua inteligência penetrante, sempre foi um estranho – por vezes, um inimigo – para a generalidade dos portugueses não comunistas. Jerónimo de Sousa, não ostentando as capacidades de Cunhal, conseguiu estabelecer uma relação normal do Partido Comunista com o país. A afabilidade, a honestidade e a humildade do actual secretário geral dos comunistas foram essenciais não apenas para que o PCP fosse olhado de forma mais benevolente pelos portugueses não comunistas, como se tornasse um partido com real influência na governação do país. Todos sabemos que o fim da URSS contribuiu, e muito, para isso, mas a figura de Jerónimo de Sousa foi fulcral para uma subtil, mas decisiva, mudança da imagem dos comunistas portugueses. Substituir o antigo operário não vai ser fácil.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

A emenda e o soneto

A situação em Espanha, devido à Catalunha, agrava-se a cada lance. E não é fácil. De facto, estes presos são presos políticos (ver aqui). Cometeram um crime contra a ordem constitucional, é verdade (mas podem argumentar que Gandhi, Mandela, os Timorenses de Leste, por exemplo, cometeram crimes contra as ordens constitucionais em que viviam), mas não houve qualquer violência, qualquer delito comum (sim, eu sei que são acusados de peculato, mas isso é ainda uma acusação política). Se se confirmar aquilo que parece ser neste momento a tendência das sondagens (crescimento do independentismo, segundo o La Vanguardia), o que vai Espanha fazer? Se um novo governo pró-independência declarar mais uma vez de forma unilateral a independência, o que faz Madrid? Activa o artigo 155 de novo? Manda prender os novos dirigentes e convoca novas eleições? A jogada de Rajoy pareceu inteligente pela rapidez, mas é um grande risco. E estas prisões - no âmbito da lei em vigor, diga-se - podem ser, para os interesses de Madrid, uma emenda pior que soneto.

terça-feira, 31 de outubro de 2017

A boca fechada

Há coisas que me escapam, confesso. Por exemplo, deixar a língua à solta quando se faz política. Numa democracia, por incipiente que seja, qualquer coisa que seja dita é escrutinada até mais não poder. Rui Rio podia muito bem dizer que com ele as contas do Estado seriam rigorosas. Isso é uma coisa, outra é dizer que faria tal como Maria Luís Albuquerque ou pior. Percebe-se que Rio precise de mostrar-se diferente de Santana Lopes, o qual, segundo palavras do próprio, não vive com a obsessão do défice  (claro que não, todos sabemos que não). No entanto, não é necessário, mesmo para dentro do seu partido, fazer juras de amor por uma política que conduziu à saída do poder. Esta sobranceria não leva a lado nenhum. Não passa de uma bravata inútil e pateta. Para um político, qualquer coisa que possa pôr em causa o seu caminho para o poder é uma irracionalidade. Há pessoas – por norma vão para a política – que ganhariam muito se nunca abrissem a boca. Como seriam convincentes.

domingo, 29 de outubro de 2017

Liberdade para escolher

Como todos sabemos, os sistemas concorrenciais têm vantagem sobre os sistemas não concorrenciais, menos em Portugal onde a concorrência concorre para que tudo seja menos concorrencial. É assim na política, na religião, na moral e até na economia. Descobri, porém, que noutras áreas de pendor mais científico a concorrência também é benéfica para os consumidores. Falo a sério. Um exemplo, pedirá um leitor mais extemporâneo. E eu respondo: na meteorologia. A concorrência meteorológica é excelente e presta-nos a todos um grande serviço. Descobri que as previsões do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) são sempre cerca de 2 a 3 graus mais elevadas do que as do Meteoblue. Quando o constatei, imaginei logo que o Milton Friedman estava certo. Como não suporto o calor, olho para as previsões do IPMA, rio-me a bandeiras despregadas, e passo, de imediato e impante, para as do Meteoblue, que recolho embevecido e obrigado. Não há nada como a liberdade para escolher.

A revolução catalã

No último lustro do anos noventa do século passado, assisti, no ISCTE, num seminário da responsabilidade de Maria Carrilho, a um conjunto de conferências. Uma delas foi dada por um catalão, professor em Harvard, cujo nome acabei por esquecer. Recordo-me, porém, de ele ter dito que o problema da independência da Catalunha, com a adesão à CEE, deixara de se colocar. Não fazia sentido, agora que o Estado-Nação estava a perder força para as estruturas supranacionais e para as regionais, trazer para a agenda a questão independentista. A sociedade catalã sentia-se bem com as perspectivas que se lhe abriam, de uma autonomia cada vez mais alargada, com uma relação cada vez mais chegada a Bruxelas do que a Madrid.

Duvidei e acabei por perguntar pela situação na educação. Foi-me dito, tanto quanto me lembro, que aí o sentimento era diferente. Língua catalã, história da Catalunha, cultura catalã e um apagamento progressivo da língua, história e cultura espanholas. Isto reforçou a minha dúvida. É nos aspectos simbólicos que reside a força de qualquer independentismo. Por vezes, as questões económicas disfarçam-no, mas mal há uma crise – e ainda por cima se essa crise é reforçada pela inabilidade política e os tiques nacionalistas de Madrid e pelo aventureirismo da elite política nacionalista catalã – as coisas têm todas as possibilidades de dar para o torto, como estamos a assistir, nesta revolta do nacionalismo catalão.

Uma revolta, aliás, que traz uma novidade como salientava ontem Jorge Almeida Fernandes, no Público, ao citar o historiador francês Benoît Pellistrand, que se questionava se não estávamos perante a primeira revolução contra uma democracia liberal. Este aspecto tem sido muito pouco salientado, mas na verdade aquilo a que assistimos é ao confronto de uma paixão nacionalista com a ordem demo-liberal existente em Espanha. E o grande perigo de toda esta história é que a paixão nacionalista catalã acabe por acordar a sombria paixão nacionalista espanhola. Portugal nada tem a ganhar com o assunto e muito menos com o confronto dos nacionalismos do vizinho do lado. E isto não só por causa da economia, mas também da política. As ondas de choque deste tipo de confrontos costumam não respeitar os marcos que traçam as fronteiras.

sábado, 28 de outubro de 2017

Obsessões

Na candidatura de Santana Lopes à liderança do PSD há qualquer coisa de estranho. Um sentimento de desadequação ou de intempestividade. Isto não tem nada de pessoal ou, sequer, de ideológico. Simpatizo com a personagem, parece-me um bom tipo, embora não vote na sua área política. Olha-se para ele e percebe-se que pertence a um tempo que já passou. Veja-se, por exemplo, a afirmação “não sou candidato por obsessão por défice zero”. Agora que a esquerda, de forma assumida ou encapotada, se interessa vivamente pela redução do défice e por ter as contas do Estado em ordem, é estranho ouvir um candidato a líder do PSD dizer que não tem obsessão pelo défice. O problema não é da obsessão. Ninguém tem obsessão por défice zero, nem mesmo Passos Coelho teria. O problema é que, se a situação internacional descambar, talvez seja melhor ter as contas em ordem do que não as ter. Na verdade, Santana Lopes faz parte de uma geração de políticos em que o dinheiro do Estado compra a eleição. Não é só ele e não é só no PSD, claro. No PS, são multidão. Ora, esse tempo acabou. O melhor, mesmo sem obsessões, é compreender que o Estado deve ser frugal. Frugal não quer dizer mínimo. Quer dizer que deve gerir os dinheiros públicos com respeito e parcimónia, sem descurar as suas funções políticas e sociais.

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Como no Netflix

É como numa série do Netflix. Estas palavras de um jovem apoiante da independência da Catalunha reflectem o carácter ficcional da proclamação da independência. Todos gostam da série mas ninguém acredita que ela seja a realidade.

http://www.lavanguardia.com/politica/20171027/432388315761/independentistas-parlament-catalunya.html

Argumentos esmagadores

Portugal, através de alguns esforçados militantes das redes sociais, deu um precioso contributo para a teoria da argumentação política. Dois esmagadores argumentos são agora apresentados nos debates online e com os quais qualquer tese fica de imediato demonstrada. E que extraordinários argumentos são esses que, mal pronunciados, tornam manifesto que quem os utiliza está na verdade? Quais são essas evidências que deixam a evidência cartesiana à beira de um ataque de nervos. Na verdade, não são dois, mas um formulado de dupla maneira. Eu sei que o leitor está desejoso de enriquecer o seu baú dos argumentos, os quais hão-de ajudá-lo a pôr de rastos os seus adversários políticos. Calma, a espera recompensa. Alguém diz alguma coisa – por exemplo, os tipos do governo são todos uns corruptos ou o pessoal de teu partido está a preparar-se para meter a mão no pote – e demonstra-a, de imediato, com um troante “E mais não digo!”. O adversário ajoelha, sem fôlego. Esta é a versão discursiva do argumento. Há também uma versão topológica. Depois de enunciada uma qualquer tese, por norma idêntica às anteriores, o excelso retor fulmina o adversário com o poderoso argumento: “E por aqui me fico!”. Não imagina o leitor, como o adversário fica siderado com um “E mais não digo!”. Fica em profundo silêncio hesitando se se há-de converter ou cometer hara-kiri. E perante o poderoso “E por aqui me fico!”, o que pode acontecer? Consta que, perante a evidência do argumento adversário, há pessoas que se atiram para dentro de poços ou da janela de um qualquer quinto andar. “E por aqui me fico!”. Portugal entrou para história da retórica política. “E mais não digo!”

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Esperar sentado

Parece que um dirigente obscuro do PS, no jornal da agremiação, se atirou ao Presidente da República, como gato a bofe. Continuo a não compreender o grau de amadorismo que tomou conta dos socialistas. Pensava que por lá existia quem soubesse, em primeiro lugar, ler os sinais e, depois, quem tomasse conta dos impulsos para evitar mais estragos. Se alguém, no PS, julga que tem a mínima possibilidade de impor, na opinião pública, uma narrativa diferente da de Marcelo Rebelo de Sousa sobre as calamidades que nos atingiram, então espere sentado. O PS está naquele momento – que, se tiver muito juízo, pode ser transitório – que o melhor é fazer-se de morto. Se acha que o caminho é abrir uma frente de guerra com o Presidente, então parece mesmo aqueles ratos que se vão colocar na boca do gato. Ninguém põe ordem na casa?

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Política pura e dura

Há pessoas que gostam de Marcelo Rebelo de Sousa por causa dos afectos e outras que o detestam por isso mesmo. Há quem não goste dele porque não faz o jogo da direita e outros porque deixou de fazer o da esquerda. Todos estes sentimentos são, contudo, irrelevantes. Estas ondas de afectos que, desde o início do mandato, marcam a atitude do PR são actos políticos e actos muito importantes. Haverá sempre quem diga que fazem parte da estratégia de reeleição. Por certo que sim, mas têm um papel central na democracia portuguesa. Cobrem um espaço político a que os partidos não chegam e que pode ser ocupado por um qualquer populismo que a desgraça traga. Marcelo põe dentro do regime aqueles que dele se foram perdendo. Ele é o pastor que não quer que nenhuma ovelha se tresmalhe. E este papel, reconheça-se, é fundamental para a saúde da democracia, ao tornar visível o que era invisível, obriga que os poderes eleitos tenham em consideração essa multidão de esquecidos que existe país fora. Isto é política pura e dura - uma boa política - e não efusão sentimental.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

A grande coligação

Depois da trágica saga dos fogos, parece que ainda não se percebeu nada, rigorosamente nada. Nem à esquerda, nem à direita, nem nos independentes, nem nos apolíticos. O problema não é da prevenção, nem do combate, nem da floresta, nem da ordenação do território, nem da desertificação. Tudo isso é problemático, muito problemático, mas o principal problema não está aí. Está na leviandade que tomou conta de tudo, de todas as instituições. Raramente se leva alguma coisa a sério. Raramente há autoridade política. Raramente há pensamento sério. Tudo é, neste país, circunstancial. Tudo é uma encenação medíocre para que os medíocres, independentemente da cor do governo, governem. As instituições promovem medíocres. E, como se sabe, a má moeda expulsa a boa. Os medíocres conspiram, protegem-se, tornam a vida insuportável aos que tentam pôr um pouco de ordem e de sensatez nas instituições. Os medíocres apropriaram-se dos partidos e constituem agora uma verdadeira coligação que governa Portugal. Esta coligação não é de esquerda, nem de direita. Ela é de todas as cores. Os governos caem, mas a coligação mantém-se e governa o país. É inexorável. Liquida quem mostre o mais leve resquício de talento. Quando se fala em meritocracia em Portugal dá-me vontade de rir. Um país entregue à estupidez manhosa, à impreparação, ao compadrio dos medíocres. Um país onde se cultiva estultícia para se colher desgraça. Esse é o grande problema. Tudo isto é muito, muito cansativo.

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Hooliganismo político

As redes sociais são um lugar interessante para observar o hooliganismo político, tal como o descreve Jason Brennan. Em linhas gerais, podemos descrever o hooliganismo político como um interesse vivo pela política marcado pela incapacidade de, falando à maneira kantiana, se colocar no lugar do outro e conseguir perceber e explicar as crenças desse outro. Olhando para as redes sociais, a generalidade dos que se exprimem sobre questões políticas são, na verdade, hooligans. Há excepções, mas diminutas. Há hooligans de direita e hooligans de esquerda. Em ambas as facções, há hooligans mais amenos e hooligans mais exaltados. Uma das coisas mais curiosas é perceber a diferença entre os exaltadas hooligans de esquerda e os exaltados hooligans de direita. A exaltação dos hooligans de esquerda é sempre mais ideológica. Fazem acusações aos políticos do outro lado com epítetos marcadamente políticos. Estes epítetos políticos são atirados, claro, para desqualificar as pessoas a quem são dirigidos. Já o hooliganismo de direita usa menos epítetos políticos e mais ataques ao carácter dos políticos adversários. Tudo isto, claro, é uma tendência, pois encontramos os dois tipos de ataque em ambos os lados. O hooliganismo de esquerda ataca politicamente para rebaixar a pessoa. O hooliganismo de direita ataca a pessoa para a rebaixar politicamente. Complementam-se.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

O abandono

Decididamente, a Tykhe (a Fortuna, para os Romanos) abandonou António Costa. Não lhe fechou a boca há dias e agora, pior, não lhe iluminou as escolhas. Depois de o ter adulado, a deusa decidiu perdê-lo. Políbio, o geógrafo e historiador grego do século II aC, homem que sabia destas coisas, tinha por certo que sempre que as causas de certos eventos naturais fossem obscuras, era justificado atribuí-las à deusa. A velha rameira volúvel oferece o seio aos homens e, ainda eles não saborearam o prazer da conquista, já ela congemina, sem explicação nem piedade, a cegueira e o plano que os há-de levar à queda. Não acreditam, pois não? E já repararam no tom oracular do PCP? Não, os comunistas não vão derrubar o governo, mas já sabem o que vem aí. Andam nisto há muito.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Ponto da situação

Eu não sei se as pessoas que apoiam a actual solução governativa - e eu sou das que apoia - já perceberam a situação. A Assembleia não é dissolvida pura e simplesmente porque o PSD está sem liderança. E se houvesse dissolução da Assembleia, a esquerda de pouco se poderia queixar. O PS não deixou de ser o que era, uma das traves que, juntamente com o PSD e o CDS, levaram o país aonde está. O PCP e o BE, que poderiam ter tido uma função regeneradora e limitadora dos velhos hábitos do PS, limitaram-se a ficar de fora a discutir a mercearia (eu sei a mercearia é importante). Tirando os assuntos de mercearia (torno a dizer que sei que a mercearia tem a sua importância), deram carta branca ao PS. Para dizer a verdade, acho que os pressupostos que criaram esta solução governativa arderam nos fogos de domingo. Não basta mudar uma ministra. Talvez - mas aqui não tenho qualquer certeza - a esquerda, tendo em conta situação do PSD, ainda tenha uma oportunidade de regenerar a sua solução de poder, mas muita coisa terá de mudar e mudar drasticamente. Se não, a legislatura não chega ao fim.

Um jogo

O espectáculo, embora triste, não deixa de ser interessante. Entrámos em plena intifada. As partes, armadas de pedras, ululam e arremessam-nas sobre o lado contrário. Uns estão mais defensivos, nos outros subiu a adrenalina. Uns indignam-se pelo que não foi feito no passado; os outros, pelo que não foi feito no presente. Os que se indignam pelo passado são cegos para o presente. Os que se indignam pelo presente são cegos para o passado. O espírito exaltado que pastoreou a primeira República está, mais uma vez, à solta. Uns pensam: agora é que damos cabo deles, carregue-se fundo; os outros cogitam: há que aguentar o embate até que a maré vire. Nada disto tem a ver com as mortes, nem com a floresta, nem com o país. É um velho ódio que começou bem antes da primeira República. Talvez tenha começado com D. Miguel e D. Pedro, ou, o mais certo, ainda antes, com o Pombal e os Távoras. É um jogo. Disputa-se, pedras na mão, quem fica no lugar do Marquês e aqueles que se hão-de queixar de um azar dos Távoras. Não há assassinatos porque passou de moda. O resto? Pouco interessa, até porque as partes são o espelho uma da outra.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Formações

A formação do cidadão deveria começar com a leitura do capítulo VIII, do primeiro livro de Samuel. Está lá tudo sobre o nosso desejo de sujeição e aquilo a que nos sujeitamos. A formação do político, antes de se passar para Maquiavel, começaria com a tragédia grega. Com Agamémnon, de Ésquilo, e Édipo Rei, de Sófocles. Como são instrutivas. Ao vitorioso Agamémnon, ao chegar ao lar vindo de Tróia, esperava a morte. Não melhor destino, pois mais doloroso, coube ao sagaz Édipo. Como teria sido instrutivo António Costa ter faltado a umas reuniões da juventude partidária para meditar tais tragédias. A Tykhe é uma deusa muito volúvel.

Boca fechada

Hoje, na minha aula de Ciência Política, passei um documentário sobre O Príncipe, de Nicolau Maquiavel. Se soubesse o que António Costa ia dizer sobre os incêndios, bem como a ministra Constança e o secretário de Estado, cujo nome esqueci, tê-los-ia convidado a assistir ao documentário. Talvez mantivessem a boca fechada.

sábado, 14 de outubro de 2017

Avante, camaradas PSD

O melhor deste manifesto que parece que anda por aí a entusiasmar parte da militância PPD/PSD é a citação em epígrafe. De quem? De Jacques Rancière.

E quem é Jacques Rancière? Um filósofo francês que escreveu coisas como estas: «A única herança comunista que vale a pena examinar é aquele que nos é oferecida pela multiplicidade de formas de experimentação da capacidade de qualquer um, hoje como ontem. A única inteligência comunista é a inteligência colectiva construída através dessas experiências.»

Mas, dirá o leitor, ele, na citação fala de democracia. Pois fala. Então aqui fica o esclarecimento: «Devemos simplesmente chamá-lo (ao futuro da emancipação) de "democracia"? Existe uma vantagem em chamá-lo de "comunismo"? Vejo três razões para esse sobrenome. A primeira é que enfatiza o princípio da unidade e da igualdade das inteligências. O segundo é que enfatiza o aspecto afirmativo inerente à colectivização deste princípio. O terceiro é que indica a capacidade de auto-superação inerente a este processo, o seu infinito que implica a possibilidade de inventar futuros que ainda não são imagináveis.» [Para Rancière ver aqui.]


Não tarda, o pessoal do PSD anda por aí a cantar a Internacional. Avante, camaradas.

Perspectivismos

Eu não vi a entrevista de Sócrates à RTP. Há coisas que, se posso, evito. Contudo, o facebook é muito generoso. Apesar da generosidade, deixa-me confuso. Por exemplo, pelo que já li, de diversos autorias, o entrevistador foi demasiado educado e brando, e, ao mesmo tempo, segundo outras autorias, foi demasiado agressivo. Como se vê, o Kuhn tinha razão. O que para uns é um pato, para outros é um coelho (esta não é um indirecta).

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Os passos do secessionismo

Os secessionistas catalães ganharam alguma coisa com este processo? Do ponto de vista dos objectivos políticos explícitos, eles não ganharam nada e, a curto prazo, não ganharão nada. Há, contudo, uma coisa que conseguiram: tornaram patente - até por contraste com o Reino Unido e o caso da Escócia - a existência de um bloqueio não-democrático da constituição espanhola. Tornaram visível que o regime espanhol não permite sequer aos catalães - ou a outros - dizer se querem continuar casados com o resto de Espanha. O que fica manifesto, por ausência de possibilidade de provar o contrário, é que o casamento é forçado e mantido sob a ameaça da violência. Violência legítima não deixa de ser violência. Toda a voz forte de Madrid é apenas o sintoma dessa fraqueza constituinte. Londres não precisou de ameaçar. Os escoceses escolheram.

sábado, 7 de outubro de 2017

A direita e o PCP

A direita portuguesa é devota, muito devota de S. Jerónimo. Acende velas ao santo. Reza-lhe por um milagre. Não tarda, fará procissões e romarias. Consta que o santo, além de santo, é comunista, mas a direita portuguesa adora comunistas. À séria. Ela adora comunistas, daqueles muito proletários, de fato-macaco e revolução na boca, como quem reza um rosário. Adora, mesmo. Para o provar, vendeu a EDP ao Partido Comunista Chinês, através de uma empresa do Estado chinês. Agora, está desejosa de ver greves e manifestações. Greves, para a direita portuguesa, são o máximo. Ela adora o encarnado e as greves são um mar encarnado. E mais uma velinha para o santo, coitado, que bem precisa e a direita gosta muito dos pobrezinhos e dos necessitados. E a direita chora convulsivamente pela perda de câmaras dos comunistas. Os dedos da direita não se cansam de deslizar nas contas do rosário. E que pena há no coração da direita. Coitadinhos dos comunistas. A direita chora mesmo mais que os próprios comunistas. E lá vem mais uma vela para S. Jerónimo e um rosário pelo Comité Central. O pior, para a direita, é se o santo for surdo.

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

O abraço de urso

Outra coisa sem sentido, uma tontice que a comunicação social adora pôr a correr, é a do abraço de urso. O PS de Costa estaria a esmagar o PCP, tal como o PS francês de Miterrand teria esmagado o PCF. É verdade que o PCP perdeu várias câmaras, algumas muito emblemáticas. No entanto, o PCP teve quase 10% dos votos, muito à frente do CDS, esse grande vencedor das eleições autárquicas com 2,6% e mais uns gramas provenientes de coligações. Quem ouvir esta gente, não só o PSD está moribundo como o PCP entregou já a alma ao criador, devido ao abraço do Costa.

Profecias sobre o PSD

Uma das coisas mais idiotas que se propaga no comentário político nacional é a profecia sobre o futuro do PSD. Auguram-lhe terríveis travessias no deserto, anos, talvez décadas, fora do poder, sei lá que mais. Por mim, nada tenho contra. Contudo, tudo isto não passa de fantasia sem pés nem cabeça. Quantas décadas de purgatório foram prognosticadas ao PS após os anos negros de Sócrates? Ainda se lembram dos comentários? A realidade é tão volátil, as condições do país tão frágeis, que tudo pode mudar de um momento para o outro. O PSD de hoje é uma coisa, o de Fevereiro, caso haja eleições internas em Dezembro, será outra. E como será a realidade internacional daqui a seis meses ou a um ano? Ninguém sabe. Como ninguém sabia, antes das eleições de 2015 que o BE e o PCP estariam na área da governação. Se a esquerda quiser continuar no poder, o melhor é nem olhar para estas profecias estapafúrdias sobre o destino do PSD e trabalhar para que o país funcione. O resto é um palavreado inútil.

terça-feira, 3 de outubro de 2017

De joelhos

O mais interessante da esquizofrenia nacional em que vivemos é ver tanto cronista de direita - daqueles que espumam mal sentem o menor fedor a justiça social - ajoelhado perante o PCP. Em tudo vêem a hora em que o PCP dará cabo da coligação e levará, assim e sem trabalho, a direita ao poder. À noite, as velhas tias dos nossos cronistas de observatório, acendem velinhas a S. Jerónimo.

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

PSD de Torres Novas

Antes que o dia acabe e se entre em reflexão, quero dizer que não percebo em que planeta vive o pessoal do PSD de Torres Novas. A campanha é miserável, para não dizer inexistente. Parece que distribuem um panfleto com o pessoal para a Câmara e Assembleia, uma esferográfica e uma caixa para a medicação da terceira idade. Portanto, uma aposta no futuro. Ao pé do Bloco de Esquerda, são uns amadores de terceira. E depois a lista, se comparada com antigas listas do PSD, dá vontade de rir. Bem, eu sou suspeito, mas foi o que me pareceu. Até o CDS, uma raridade por aqui, esteve melhor.

quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Passos Coelho

Não há ninguém que pense e aconselhe este pobre rapaz? Por mim, tudo bem. Eu não voto no PSD nem na direita. Mas há coisas que confrangem. Passos Coelho parece aqueles jogadores que não foram convocados pelo treinador, mas que nos cafés dizem que se eles jogassem a equipa ganhava por mais e até ia duas vezes à frente do campeonato. Ele acha que fora do círculo dos militantes do seu partido alguém o leva a sério, por maior que seja a sua máscara de frade pregador? Ser alternativa ao governo é ter alternativas e não as mesmas políticas, mas que seriam melhores só porque seriam feitas pelo enviados do Senhor que aterraram todos no PSD. Isto é de uma infantilidade desmedida. Ora o país precisa que o governo e a maioria sejam confrontados com alternativas políticas inteligentes, bem pensadas e adaptadas ao país que existe (e não ao que se supõe existir). A democracia faz-se de confronto pacífico, mas firme. O país tem tudo a ganhar se o confronto for inteligente, exigente, bem preparado. Ora uma oposição casuística e cheia de patetices como estas pouco exige ao governo e à maioria que o suporta. A sério, até a mim, que não o quero no governo, estes exercícios (que nunca podem ser testados) me confrangem.

domingo, 3 de setembro de 2017

Continuação da religião

Clausewitz disse que a guerra é a continuação da política por outros meios. Eu, depois de ter a infelicidade de ver as notícias na televisão, digo: a política é a continuação da religião por outros meios. A sério. O Passos Coelho e o Jerónimo Sousa parecem párocos de aldeia a fazer homilias a uma tribo de fregueses desocupados. O Costa dá ares de bispo malandreco, sempre à espreita de piscar o olho à primeira freira que se lhe atravesse no caminho. Já a Catarina Martins e a Assunção Cristas são autênticas irmãs da caridade. De congregações diferentes, claro, mas mesmo assim do mesmo credo. E depois é preciso muita fé - uma fé que só Deus pode dar e ele anda avaro, diga-se - para os podermos levar a sério. Não, aquilo não é política. É religião. Pura e dura.