quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Eleições e política científica

Num artigo do Público, A ciência é invisível nos debates e imutável nos programas eleitorais, a investigadora Mariana Carmo Duarte afirma: Os partidos querem diferenciar-se. A ciência não é um assunto saliente, nem mobilizador ou politizado, portanto não o debatemos e torna-se cada vez menos politizado. Há um equívoco na apreciação feita. O facto de a ciência não ser debatida é já uma modalidade de politização da ciência. Como as sociedades actuais dependem em grande parte da ciência, tanto da ciência aplicada às necessidades do quotidiano, como da ciência pura, o fundamento da aplicada, não trazer a questão da ciência ao debate público é uma opção política forte e revela uma atitude das elites políticas perante o investimento em conhecimento científico.

Esta opção política, relativamente à ciência, dos partidos poderá ser uma espécie de passadeira vermelha para que a discussão sobre a política científica se faça em torno de problemas aberrantes, como o criacionismo, o questionamento ideológica da teoria da evolução de Darwin, das ciências do clima ou até da investigação científica aplicada à produção de vacinas. A aparente despolitização da ciência é apenas um acto de má fé, no sentido sartreano, de tomar decisões pela não decisão, abrindo o caminho para uma politização histérica da ciência, a qual envolverá os habituais teóricos da conspiração e ameaçará o desenvolvimento científico do país.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

A deriva da direita democrática

Não foi a intervenção de Passos Coelho sobre a relação entre imigração e insegurança, mas o apoio que está a receber no âmbito da direita moderada que mostram a deriva dessa direita em direcção às causas da extrema-direita populista (aqui). A direita moderada - mas também Passos Coelho, radicalizado há muito do ponto de vista económico e, agora, parece que do securitário - sabe que é falsa essa relação. Contudo, ela pode funcionar na exploração das emoções e agregar votos. Ir-se-á assistir a um resvalar cada vez mais acentuado da direita democrática da esfera da racionalidade para a das emoções, território de predilecção do populismo (escutar aqui a interessante entrevista à socióloga franco-israelita Eva Illouz). Infelizmente.

terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

As declarações de Macron

As declarações do Presidente francês, Emmanuel Macron (aqui), são mais um sinal de que a situação política na Europa é de profunda instabilidade. Ao admitir como possibilidade efectiva o envio de tropas europeias para combater na Ucrânia, Macron está a assumir, de forma nítida, que o problema da Ucrânia não diz respeito apenas aos ucranianos, mas é um problema da segurança europeia. A posição do Presidente francês significa que existe nos parceiros europeus, ou em parte substancial deles, a convicção de que a guerra na Ucrânia é apenas o primeiro passo para uma tentativa de destruição da União Europeia e de dominação da Europa. As múltiplas declarações de altas patentes militares, de diversos países europeus, bem como informações provenientes de diversos serviços secretos parecem confirmá-lo. A ideia de uma paz perpétua na Europa, depois  do trauma de duas guerras mundiais no século passado, está a esboroar-se a cada dia que passa.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Um aviso para os incautos

Hoje, Passos Coelho entra na campanha da AD. O antigo primeiro-ministro tem boa recepção na direita. O seu apoio a Montenegro pode ajudar a segurar votos que podem ir tanto para o Chega como para a Iniciativa Liberal. Contudo, os mais incautos deverão pensar o que significa este apoio. E um dos seus sentidos é que a AD de Luís Montenegro e Nuno Melo não tem uma intencionalidade política diferente daquela que tinha a coligação de Passos Coelho e Paulo Portas. Por detrás da retórica sobre o choque fiscal, emergem de novo soluções que vão pôr em causa as classes médias e populares, vão pôr em causa as pensões. Passos Coelho representa o radicalismo liberal e a sua presença na campanha, para ajudar a não perder votos para os radicais de direita, é um aviso para os incautos de memória curta.

domingo, 25 de fevereiro de 2024

A ilusão anti-elitista

A investigação de Miguel Carvalho, A grande "família" do Chega, no Público, mostra que Portugal está alinhado no que se passa por outras paragens, onde a extrema-direita e o populismo grassam, infestando as democracias liberais. Estes movimentos, com o trumpismo norteamericano em lugar de destaque, têm todos eles uma retórica anti-elitista. Esta retórica parece ser de grande eficácia junto de parte da população em situação mais vulnerável. Ora, quando se vai ver os grandes apoios a este tipo de organização política, os apoios que a permitem crescer, eles vêm precisamente dessas elites, que têm dois traços comuns fundamentais, o conservadorismo social e o ultraliberalismo económico. O primeiro significa o desejo de se intrometerem, em nome das suas crenças e valores, nas liberdades dos outros, diminuindo-as. O segundo representa a possibilidade de se libertarem das poucas regras que protegem, na economia de mercado, aqueles que vivem do trabalho que prestam a terceiros. A consequência disso será não apenas um reforço patrimonial e simbólico das elites - uma velhas, vindas do salazarismo, outras novas -, mas um passo decisivo para uma maior degradação da vida de muitos daqueles que procuram no Chega a salvação da sua situação existencial. 

sábado, 24 de fevereiro de 2024

A poligrafização da política

Tornou-se um topos da análise política feita na comunicação social o recurso à confrontação entre o que dizem os actores políticos e a realidade, numa espécie de recurso a detectores de mentiras. Este exercício poligráfico é interessante, mas é duvidoso que tenha algum efeito na consciência dos cidadãos. Ninguém muda de intenção de voto porque os políticos do seu lado dizem mentiras. Os outros também dizem, pensará. E mentiras por mentiras, prefiro as do meu lado. Há casos mesmo que, como acontece nos movimentos populistas e de extrema-direita, mentir é uma condição pelo menos necessária para ser apreciado como líder. A questão não está no facto de termos entrado na era da pós-verdade, mas antes no caso do que está em jogo na política não é a verdade, mas o poder, que os meus cheguem ao poder. A verdade é meramente instrumental na política de hoje, como sempre o foi. Quando se acusa o adversário de mentir não é por amor à verdade, mas para tentar, talvez em vão, obter uma vantagem política. Por isso, as campanhas contra a desinformação têm tão poucos resultados, como o têm os múltiplos polígrafos que por aí existem.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

As touradas do PAN

Não se discute aqui a bondade ou maldade moral das touradas, mas o exercício de mau gosto e a péssima literatura. Na sua cruzada contra as touradas, o PAN decidiu converter-se ao engraçadismo, influenciado pelo êxito que a extrema-direita tem tido com essa triste moda. Colocou no Campo Pequeno um outdoor com os seguintes dizeres: Touradas só na cama / E com consentimento. Isto no lado esquerdo. No lado direito há uma cama de casal meio desfeita e, no canto superior direito, o símbolo do partido. Deixemos, contudo, o mau gosto do recurso a uma sugestão da sexualidade, eventualmente exuberante. Demoremo-nos na metáfora. Os parceiros sexuais devem consentir em que tipo de tourada? À portuguesa ou à espanhola? Se for à espanhola, o que fizer de toureiro terá o direito de matar o que faz de touro, por certo. Mas se a inclinação literária do PAN for nacionalista, será antes uma tourada à portuguesa. Na cama, o toureiro, apeado ou a cavalo, poderá espetar no que fizer de touro as bandarilhas, mas este só morre nos curros. Parece que para o PAN o problema das touradas reside no sofrimento animal, mas esse sofrimento não será problemático numa cama com seres humanos, desde que consentido, talvez uma antecipação da eutanásia livre. Uma coisa é certa, no PAN não abunda talento literário nem boas relações com a tropologia.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

O BE e a política externa

Entre várias outras medidas de política externa, o Bloco de Esquerda propõem, no seu programa eleitoral, a saída de Portugal da NATO e a defesa do desarmamento negociado e multilateral. O que o BE não explica é como Portugal, fora da NATO, se poderia defender caso fosse atacado e isso é uma possibilidade real nos dias de hoje. Certamente, os dirigentes bloquistas diriam que defendem um desarmamento negociado e multilateral. Esta seria a resposta, tendo em conta o que se escreve no programa eleitoral, mas isso, na verdade, não responde ao problema da defesa do país em caso de necessidade. 

Ora, por muito que Portugal pudesse defender semelhante posição, isso em nada alteraria a realidade geopolítica, apenas enfraqueceria Portugal. Não depende de Portugal a existência de potências inimigas que não se querem desarmar, antes pelo contrário. Não depende de Portugal nem da União Europeia, o facto de haver uma ameaça muito séria à segurança dos povos europeus. Defender o desarmamento negociado multilateral é defender rigorosamente nada, um exercício retórico que cobre uma posição absolutamente irrealista, fundado num dogmatismo ideológico que torna o BE incapaz de analisar a realidade geopolítica. Na prática, seria uma capitulação do país.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

A questão dos 2%

Num artigo no jornal Público (aqui), Nuno Severiano Teixeira, antigo ministro da Administração Interna e da Defesa Nacional, faz uma análise da situação geopolítica da Europa e o problema colocado por uma eventual eleição de Donald Trump. Salienta, a certa altura, que apenas dois partidos se comprometem com os 2% de gastos na área da defesa, tal como foi acordado pela NATO, na cimeira de Gales, em 2014. Esses partidos são o Chega e o Partido Socialista. A única surpresa é a tergiversação da AD perante esse objetivo de reforço da defesa nacional. Não terá percebido a realidade onde vivemos? Chegou a altura de explicar aos portugueses que a paz na Europa não é um bem eterno e que a possibilidade de uma guerra onde Portugal se veja envolvido está longe de ser uma distante fantasia distópica. Também se deve explicar que a eventual implosão da NATO, por iniciativa dos EUA, uma possibilidade real com a eleição de Donald Trump, não apenas nos deixará muito mais vulneráveis aos inimigos actuais, como gerará condições para a emergência de novos inimigos, mesmo entre aqueles que hoje estão no campo dos amigos. A questão dos 2% é fundamental, mas não basta por si só. Os problemas militares não dizem respeito apenas aos militares, mas a todos nós.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

O gesto de Ana Abrunhosa

Ana Abrunhosa, ministra do actual governo e candidata socialista por Coimbra, abandonou uma mesa redonda com diversos partidos políticos depois de ouvir as declarações de António Pinto Pereira, candidato pelo Chega. As declarações visaram a comunidade de imigrantes e as mulheres (aqui). Não sei se o gesto da ainda ministra tem algum relevo eleitoral. Presumo que não terá. Contudo, tem um efeito moral. Separa as águas entre aqueles que se reconhecem num certo tipo de cultura e civilização e os que estão desejosos de a fazer implodir. Quando André Ventura, ainda militante do PSD, se candidatou em Loures, com o apoio do seu partido e do CDS, e começou a ensaiar a sua deriva xenófoba e racista, o CDS retirou-lhe o apoio, mas Pedro Passos Coelho, então líder do PSD, não o fez. De certo modo, Passos Coelho tornou-se cúmplice daquilo que veio depois e que está a degradar não apenas a vida política, mas a vida social. Sempre houve, entre nós racismo e xenofobia, mas tinham vergonha de se manifestar. O Chega representou a emancipação desse discurso odioso da tutela da boa educação e da vida civilizada.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

A futebolização da política

A degradação do ambiente político, que resulta numa intensa polarização política, com uma paulatina transformação dos adversários em inimigos, tem, nos debates entre candidatos destas eleições, um novo e preocupante sinal. Esse sinal é a extrema futebolização da política. Tal como no futebol, também estes debates têm tido, depois de ocorridos, painéis de comentadores que fazem leituras dos debates (e avaliam desempenhos, como há muito se avalia no futebol), tentando impor aos espectadores uma leitura, a sua, do ocorrido, tal como acontece no futebol. Mais, tal como no futebol se fazem antevisões dos jogos, também agora se fazem antevisões dos debates. 

Este modelo rentável para as televisões, pois alimenta paixões e estas geram audiências, degrada a vida pública e socava a democracia enquanto debate racional sobre o bem comum. Mesmo que os comentadores das televisões não sejam adeptos da degradação democrática e activistas pró-populismo, o modelo de negócio televisivo que explora a política como se fosse futebol é uma forma de propaganda sistemática de atitudes que acabam por conduzir à adesão a visões populistas da política, à degradação democrática e à transformação de adversários políticos, racionalmente, embora de modo plural, orientados para o bem comum, em inimigos políticos que devem ser suprimidos. Não é um acaso que o chefe do partido populista, o que mais progride nas intenções de voto, era um comentador de futebol.

domingo, 18 de fevereiro de 2024

Eleições e ambiente

Não é apenas a questão da política externa que está francamente subvalorizada na actual campanha eleitoral. Tudo o que é incómodo é varrido para debaixo do tapete. Com dificuldade se fala da questão da justiça. Outro elefante dentro da sala que se procura esconder debaixo do tapete é o ambiente e as questões climáticas. Um artigo de Guilherme Serôdio, no Público, torna clara a dimensão do problema ambiental e como a única solução efectiva é muito difícil, ou mesmo impossível, de ser tomada. Essa solução é o decrescimento económico. Ó que significa, na realidade, decrescimento económico? Significa empobrecer, significa que todos temos de consumir menos, muito menos. Não se trata apenas, por exemplo, de passar de automóveis movidos a derivados do petróleo para automóveis movidos a electricidade. Trata-se de reduzir, talvez drasticamente, o número de automóveis em circulação. Uso aqui o exemplo do automóvel pois é aquele que mais fere as pessoas. Não ter automóvel é sentido como um ataque ao estatuto social, à liberdade e, em última análise à identidade pessoal. Não é por acaso que, para além de considerações piedosas, a questão ambiental (isto é, da sobrevivência da humanidade na Terra) é um não assunto eleitoral. Ninguém ganha votos prometendo o decrescimento económico, prometendo um país em que todos seremos mais pobres, até porque em lado nenhum isso está a acontecer. A ideia que tomou conta da espécie humana é que ela tem um direito divino a consumir cada vez mais, tem direito a empanzinar-se de bens e se a coisa correr mal, como está já a correr, tem o direito de cair no abismo, regurgitando tudo o os deuses que a movem lhe deram direito a consumir. 

sábado, 17 de fevereiro de 2024

A apropriação do Bloco de Esquerda

Um conflito entre o cantor Pedro Abrunhosa e o Bloco de Esquerda (BE) (aqui) torna patente um problema de política de propriedade da linguagem. O conflito surge devido ao slogan de campanha do BE, Fazer o que nunca foi feito, ter semelhanças com um título de um tema do cantor, Fazer o que ainda não foi feito. Abrunhosa considera que há uma "apropriação indevida da propriedade intelectual alheia". Apresentou queixa na Sociedade Portuguesa de Autores. 

O problema não está na semelhança entre as duas expressões linguísticas. Ambas as frases, além de correntes no uso dos falantes, inscrevem-se no domínio da retórica política e são tomadas como tendo o mesmo conteúdo semântico, podendo considerar-se equivalentes. O problema, porém, não é semântico, linguístico ou mesmo retórico.

O problema reside no facto de as duas expressões serem usos triviais da língua portuguesa, que qualquer português usa e usava ainda antes de Pedro Abrunhosa ter nascido. Se o facto de um autor mobilizar para título de uma obra uma expressão trivial da língua o torna proprietário da expressão, então alguma coisa de muito errado existe no código de propriedade intelectual. A língua não é um conjunto de palavras e de regras gramaticais, é também o uso que a comunidade de falantes faz dela, no qual se cristalizam inúmeras expressões de que ninguém é proprietário.

Imagine-se que alguém escreve um livro, lhe dá o título Isso não é boa ideia e regista o livro e o título numa sociedade de autores. A partir daí passa a ser detentor da propriedade intelectual de uma expressão que não inventou? Que ninguém mais pode, sem infringir a propriedade intelectual, usar essa expressão como título de qualquer tipo de obra, slogan político ou publicitário? A consequência da pretensão de Pedro Abrunhosa, caso ela esteja escudada na lei e ainda mais se o não estiver, parece absurda.

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

Sobre o fascismo em Portugal

A entrevista com a historiadora Rita Almeida de Carvalho (aqui) toma posição, do ponto de vista da sua disciplina, sobre se houve ou não fascismo em Portugal. Entre os historiadores não há consenso, embora aqueles que defendem a existência de fascismo em Portugal são, por norma, oriundos da resistência ao regime de Salazar e Caetano. Podemos considerar a designação de fascista aplicada ao regime que caiu em 1974 a partir de dois jogos de linguagem. O jogo da linguagem científica e o jogo da linguagem política. Do ponto de vista científico, considerar o regime de Salazar e Caetano como fascista é inadequado. Como Rita Almeida de Carvalho faz notar o regime autoritário português não preenche as condições necessárias para cair na classificação de regime fascista. A entrevista explica porquê e merece ser lida. O fascismo era um regime revolucionário, deslumbrado pela técnica e assente na indústria, um regime de mobilização total da população para os desígnios do líder. O regime português era reaccionário, ruralista, indiferente à técnica e à indústria, e apostada não é mobilizar as massas, mas em desmobilizá-las (a minha política é o trabalho). Havia coisas comuns, mas tecnicamente o salazarismo, apesar de algumas organizações para-fascistas, não era fascista. Do ponto de vista do jogo de linguagem política, é admissível, porém, chamar fascista ao regime de Salazar. É uma hipérbole, mas as hipérboles têm a capacidade de, pelo exagero, mostrar o negativo e o intrinsecamente inaceitável que havia no regime. É compatível chamar ao regime de Salazar fascista, no âmbito do combate político, e negar essa classificação do ponto de vista científico. As regras do jogo da linguagem política não são as mesmas que as regras do jogo da linguem científica, seja da História ou da Ciência Política. A primeira visa a acção, a segunda o conhecimento. O que é permissível numa, pode ser epistemicamente inaceitável na outra.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

PCP, os limites da mudança

No Público de hoje há uma interessante análise de Manuel Carvalho sobre o Partido Comunista Português (aqui). Defende a tese de que o PCP é um partido duas vezes fora do tempo. Uma primeira, negativa, porque não teve capacidade de se adaptar a um mundo que está muito longe daquele em que o comunismo nasceu e para o qual pretendia ser uma solução. Uma segunda, positiva, porque a sua atitude cordata e razoável contrasta com a gritaria instalada na vida política, onde a polarização rouba discernimento aos actores com a esperança de contaminar os votantes. Esta visão de Manuel Carvalho dá uma ideia de imutabilidade do PCP. Parece-me, contudo falsa. Haverá um outro problema.

Desde a transição à democracia em 1974, mas talvez já antes, o PCP usou uma estratégia oposta àquela que fez uma das glórias do romance de Tomasi di Lampedusa, O Leopardo. Aqui, a ideia era que a mudança seria necessária para que tudo ficasse na mesma. Os comunistas portugueses fizeram exactamente o contrário. Deram sempre a ideia de um conservadorismo ideológico inamovível, mas foram mudando muito ao longo do tempo. Foi assim que deixaram de ser uma partido revolucionário e se tornaram, na prática, num partido social-democrata. Foi assim que de críticos da democracia burguesa se tornaram num dos principais defensores da democracia liberal. Para que as coisas mudem, é necessário que pareça que ficam na mesma. Quem no campo político melhor compreendeu o fenómeno foi António Costa. Quando parte para a geringonça, ele sabe que o PCP não representará qualquer obstáculo à política social-democrata do PS.

O problema desta estratégia é que ela tem limites e o PCP parece tê-los atingido. Já não pode mudar mais sem ter que quebrar as aparências. Chegou, já há algum tempo, o momento em que não basta que a realidade do PCP mude, é necessário que a sua aparência também mude. Mas mudar a aparência é confessar que o património ideológico se tornou uma relíquia no museu da História. Pior do que isso, é correr o risco de o partido se liquefazer, como aconteceu com outros partidos comunistas europeus. O problema do PCP não é se continua ou não comunista, mas como pode sobreviver no momento em que reconhecer que, na verdade, já não é, há muito, comunista. 

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

O desprezo pelo mundo livre

Num interessante artigo (aqui), Henrique Burnay refere que Donald Trump é um suicida da América e, acrescenta, que ele não quer ser o líder do mundo livre, tal como se apresentaram muitos dos presidentes americanos. O autor da dois exemplos caros aos Republicanos, Ronald Reagan e George Bush (pai). Ora, a verdade é que Donald Trump não sente nenhum respeito nem interesse pelo mundo livre, pelo mundo que resistiu aos totalitarismos fascista, nazi e comunista e que manteve viva a bandeira da liberdade. Ele não é diferente de Putin ou de Xi Jiping, para quem o mundo livre é um incómodo e uma ameaça. A diferença reside apenas nas circunstâncias. Trump vive num país que tem uma longa tradição democrática e que tem feito da liberdade um valor central. Isso não significa, todavia, que Donald Trump, caso seja eleito, não tente aproximar o regime americano dos da Rússia e da China. A não aceitação dos resultados de há quatro anos era já um passo nesse caminho.

terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

Um pacto para a educação

Há uma coisa que os políticos não percebem acerca da educação. Essa coisa é a estabilidade. A Aliança Democrática propõe-se, segundo Margarida Balseiro Lopes, vice-presidente do PSD, fazer uma revisão das Aprendizagens Essenciais (isto é, dos actuais programas disciplinares) e dos documentos orientadores do ensino. Não está em causa, a legitimidade de quem ganha as eleições de aplicar as suas políticas. O que está em causa é outra coisa. Cada nova revisão dos documentos orientadores da educação e dos programas disciplinares é um factor de profunda instabilidade na vida das escolas, nas aprendizagens dos alunos e nas práticas dos docentes. Todos os ministros, ou candidatos a ministros, do sector acham que têm ideias geniais sobre a educação e o resultado é a multiplicação do caos, com mudanças substanciais mal muda a orientação do governo. As orientações introduzidas pela governação socialista só agora começam a consolidar-se, mas já estão à porta outras, como se tudo tivesse de começar do zero. Os alunos portugueses mereciam um pacto entre os partidos, de modo a limitar a perturbação que cada novo governo insiste em introduzir num sector tão delicado como a formação escolar das novas gerações.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

Um grande silêncio

As declarações de Trump sobre a NATO trouxeram à luz o quão irrisório é o debate político nacional em vésperas de eleições. A questão política central, da qual todas as outras dependem, é a escaldante situação internacional. Ninguém quer falar disso, ninguém quer falar de que nos anos da nova legislatura podemos estar metidos em grandes sarilhos, os quais não dependem de nós, mas que nos podem envolver de um momento para o outro. Ninguém quer falar de que teremos de fazer enormes esforços militares, a começar pelo orçamento, mas também na reorganização das forças armadas. Ninguém quer falar da Europa, do facto dela estar rodeada de perigos por todos os lados e minada por dentro. Discute-se a situação do país como se ele fosse uma ilha rodeada por um oceano impossível de navegar. A direita vive fixada nos impostos, como se isso fosse uma terapia para os males que nos atormentam. A esquerda vive em retracção, tentando gerir as perdas. A extrema-direita promete tudo a todos e o seu contrário, na ânsia de criar condições para liquidar a democracia liberal. Ninguém, todavia, está disponível para dizer a verdade daquilo que está à porta. Sobre a realidade internacional, apenas um grande silêncio.

domingo, 11 de fevereiro de 2024

Domar dragões

A vexata quaestio da formação do próximo governo na região autónoma dos Açores tem sido usada como arma de arremesso contra os socialistas, como se a formação do governo fosse da responsabilidade de quem perdeu as eleições e, não tendo qualquer possibilidade de governar, teria uma espécie de obrigação moral de suportar um governo do outro bloco político. Dois artigos do Público, um de ontem e outro de hoje, chamam a atenção para duas vertentes do problema que estão a ser manifestamente ocultadas. Pacheco Pereira sublinha que esta campanha do comentariado nacional para exigir um compromisso do PS açoriano com o governo de Bolieiro deveria ser correspondida por uma campanha idêntica, desse mesmo comentariado, exigindo que Bolieiro mostrasse interesse em negociar com o PS um apoio da sua solução governativa. Coisa que nunca fez. Pacheco Pereira mostra como os dois lados são tratados de modo diferentes pelo comentariado nacional, o que enviesa a percepção das pessoas. 

No artigo de hoje, Ana Sá Lopes sublinha um outro aspecto importante do problema. Qualquer apoio que os partidos do centro dêem um ao outro, na busca de uma solução governativa, é um caminho aberto para o Chega emergir como a grande oposição ao sistema. Seri um passo, acrescento, para a destruição da natureza liberal da nossa democracia. Soluções de bloco central, atractivas para pessoas bem intencionadas, mas ingénuas politicamente, são, na verdade, um perigo, pois fomentam o crescimento dos extremos. Na actual circunstância internacional e nacional, seria o crescimento da extrema-direita. Noutros tempos, seria o da extrema-esquerda. Tanto o centro-direita como o centro-esquerda, para governarem, terão de encontrar na sua área os apoio necessários e, caso seja necessário, domarem os dragões que nela existem. Foi isso que António Costa fez e não se saiu mal. O problema dele foi quando deixou ter dragões para domar.

sábado, 10 de fevereiro de 2024

O alinhamento dos comentadores

O mais interessante do conjunto de debates em torno das próximas eleições não é os debates em si mesmos, mas o que vem depois. Discute-se quem ganhou o debate, como se aquilo fosse um jogo de futebol ou uma guerra com vencedor e vencido claramente determinado. O problema é que o colégio de árbitros é tão objectivo quanto um comentador de futebol ao serviço de um clube. Por exemplo, sobre o debate entre André Ventura e Paulo Raimundo li um comentário de imprensa em que o dirigente comunista tinha cilindrado, usando uma metáfora corrente no futebol, o dirigente do Chego. Num outro comentário também de imprensa, o resultado era exactamente ao contrário. No fundo, o que influencia o eleitorado não será o desempenho dos candidatos, mas o alinhamento dos comentadores, os quais estão longe de serem desalinhados politicamente.

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Crimes de ódio

O crescimento do populismo de direita, a sua representação parlamentar e a possibilidade de um aumento espectacular dessa representação não explicam tudo, mas ajudam a explicar alguma coisa. No ano passado, os crimes de ódio em Portugal cresceram 38% em relação ao ano anterior (aqui). Quando um discurso político de teor racista e xenófobo encontra o acolhimento que encontra nos meios de comunicação social, começa a gerar-se uma cultura em que se perdem as inibições para discriminar e violentar os que são diferentes. Essa cultura acaba por fomentar a manifestação daquilo que há pior nos seres humanos. A acção do populismo tem uma dupla vertente política. Uma política centrada na busca do poder e uma política cultural que visa substituir as normas da vida civilizada por normas fundadas na discriminação e na perseguição do outro. Pensar que o populismo nacional é benigno é deixar-se enredar numa fantasia. É tão perigoso como qualquer outro, a começar pelo de Trump e da extrema-direita americana acantonada em parte substancial do Partido Republicano.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

O conflito entre representatividade popular e estabilidade governativa

A fragmentação do espectro partidário é crescente um pouco por toda a Europa. Portugal não foge à regra. No parlamento agora dissolvido estavam representadas oito forças partidárias. Veremos como vai ser no dia 10 de Março. Os Países Baixos são um caso de grande fragmentação partidária. Numa das últimas sondagens feitas já em Fevereiro, para um parlamento de 150 deputados, estariam presentes 14 partidos políticos, com uma representação que variaria entre os dois e os cinquenta deputados. Não há métodos eleitorais perfeitos. Os que asseguram uma estabilidade fácil, os maioritários, têm uma fraca representatividade. Os que asseguram a representatividade podem ser factor de instabilidade e de difícil formação de governo. 

Há países que têm uma cláusula limite - por exemplo, na Alemanha é de 5% - para um partido poder entrar no parlamento. Tomando em consideração o exemplo da sondagem realizada nos Países Baixos e a cláusula limite alemã, dos 14 partidos que elegeriam deputados, 9 ficariam de fora. No caso de Portugal, nas últimas legislativas, a cláusula limite de 5% reduziria a 3 os partidos presentes no parlamento, o PS, o PSD e o Chega. Existem, todavia, cláusulas limite mais baixas. Na Suécia e na Noruega é de 4% e em Espanha e na Itália é de 3%. Voltando aos exemplos da sondagem dos Países Baixos e dos resultados das legislativas portuguesas de 2022, uma cláusula limite de 3%, teria o seguinte impacto. Nos Países Baixos, passar-se-ia de 14 partidos representados, segundo a sondagem, para 7. No parlamento português eleito em 2022, passar-se-ia oito partido presentes no parlamento para seis. Note-se que a cláusula limite é proibida constitucionalmente em Portugal. O problema que se coloca nas democracias europeias é como compatibilizar a representação popular e a estabilidade governativa.

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Um erro do regime democrático

A actual onda de contestação existente na PSP e na GNR é o sintoma de um erro do regime democrático português e, provavelmente, de outros. Não se compreende que órgãos de soberania e forças de segurança interna e externa tenham a possibilidade de se organizar em sindicatos, associações sindicais, associações de classe, etc. De algum modo, são agentes do poder político, responsáveis, como os agentes políticos, pela saúde das instituições da República e não simples cidadãos que têm um emprego e estão sujeito ao conflito entre empregadores e empregados. Juízes, magistrados do ministérios público, militares e polícias deveriam ter um estatuto que os impedisse rigorosamente de reduzir as suas funções a um mero emprego, e por isso organizarem-se em associações sindicais ou para-sindicais. Contudo, a esse estatuto que os privaria de uma parte da cidadania deveria também corresponder um reconhecimento, do ponto de vista económico, efectivo. O país não deve ter pejo em pagar bem quem defende a paz e a ordem públicas, bem como a segurança de pessoas e bens. Deve fazê-lo, não porque uma dada corporação tem força reivindicativa, mas porque se reconhece a diferença específica dessas funções para uma vida boa em sociedade. Não apenas deve pagar bem, como deve ser exigente na avaliação do desempenho dessas funções. Os pilares do Estado são os alicerces do funcionamento da sociedade e do regime democrático. Devem ser reconhecidos como tal.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

A esquerda à beira de uma derrota dolorosa

A esquerda portuguesa pode estar à beira de uma derrota dolorosa, caso se confirmem os resultados da última sondagem (aqui). A questão nem está no facto de a direita ganhar as eleições, mas na dimensão da derrota da esquerda. Toda somada (PS+BE+CDU+Livre), a esquerda pode não chegar aos 40%. Isto mostraria que o eleitorado do PS que, em eleições anteriores, se voltava, quando decepcionado, para os partidos à sua esquerda, agora parece transferir-se para a direita. Parte, por certo, para a AD, e parte para o Chega. O que se perfila é uma derrota de facto e uma derrota simbólica, com uma rejeição clara dos valores e dos actores propostos pela esquerda.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Açores, a vitória da instabilidade

É possível que as eleições dos Açores tenham aumentado a instabilidade política na Região. Ao recusarem uma maioria absoluta à AD, os eleitores açorianos colocaram os vencedores nas mãos dos vencidos. Para governar, José Manuel Bolieiro precisa da boa vontade ou do Chega ou do PS. Em política, contudo, a boa vontade é coisa que não existe. Tanto o Chega como o PS irão calcular os ganhos e as perdas de uma eventual boa vontade, depois agirão em conformidade com os seus interesses. A AD ganhou as eleições, mas não está em melhores circunstâncias do que estava anteriormente, onde as tinha perdido, mas conseguira um apoio maioritário na Assembleia Regional. A infidelidade do Chega foi apreciada pelo eleitorado, pois rendeu votos. E se amanhã lhe render ainda mais votos, não hesitará em derrubar o novo governo. Também o PS irá calcular os seus interesses eleitorais a cada momento. Tudo parece indicar que nos Açores a confusão aumentou.

domingo, 4 de fevereiro de 2024

Um racismo absurdo

Há sempre qualquer coisa de absurdo nestas organizações e acções de extrema-direita portuguesa como aquela que se realizou ontem em Lisboa contra a "Islamização da Europa". Olha-se para os neonazis nacionais, para os racistas mais empedernidos, e fica-se com a sensação que, pelo aspecto (coisa a que os racistas dão muita importância), são todos descendentes dos mouros que por cá viveram e uma parte por cá ficou. Se há uma coisa de que os portugueses deveriam ter pudor era o racismo, pois somos todos fruto de múltiplas trocas genéticas, descendentes dos mais variados e desencontrados povos. Se noutros lados a ideia de uma comunidade etnicamente pura é um delírio, em Portugal só pode ser o fruto de uma cegueira física. Basta olhar para os portugueses para perceber que somos, felizmente e essa é uma riqueza e uma das nossas vantagens, o fruto de mil encontros. O racismo é moralmente reprovável e, no caso dos portugueses, um exercício absurdo de negação da nossa identidade real.

sábado, 3 de fevereiro de 2024

Identidade e radicalização política

As posições da extrema-direita e da direita radical, as únicas forças políticas em expansão, assentam numa contínua falsificação da realidade. É a partir desta falsificação que se constroem narrativas que exploram descontentamentos que são transformados, primeiro, em ressentimento, depois, em raiva, até que explodem como ódio. Uma ilusão persistente em muitos sectores demoliberais é de que as pessoas fascinadas por essas forças se desradicalizariam ao serem confrontadas com os factos que desmentem as narrativas extremistas. O problema é que os factos não interessam a quem se radicalizou politicamente. Existe mesmo um efeito curioso. Quanto mais se torna patente a falsidade de uma certa narrativa, mais as pessoas a defendem. O problema reside na questão da identidade. O que as forças extremistas e radicais de direita estão a conseguir, como nenhumas outras, é que as pessoas reconstruam a sua identidade pessoal no interior de uma identidade mítica de natureza política. Ora, cada demonstração da falsidade da narrativa constitutiva dessa identidade mítica de natureza política é sentida não como uma contestação através de factos de uma visão política, mas como um ataque pessoal. A verdade é sentida, por quem se radicalizou, como uma ameaça aquilo que é e, como tal, uma ameaça à sua identidade e a si mesmo. O talento da extrema-direita e da direita radical é o de transformar, para utilizar a linguagem do filósofo Jason Brennan, hobbits, sujeitos passivos em política, em hooligans, sujeitos toxicamente activos, incapazes de aceitar outros pontos de vista. Estamos perante um abismo e não sabemos lidar com ele.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Chega a caminho de destruir o PSD

As sondagens eleitorais começam a mostrar que não é de todo impossível a Aliança Democrática ser ultrapassada nas urnas pelo Chega. Se isso acontecer, André Ventura dará um passo gigante para alcançar um dos seus grandes objectivos, destruir o PSD. Para os partidos radicais e extremistas é essencial destruir os partidos moderados da sua área política. A partir daí, estão em condições para intensificar a polarização e pôr o regime num estado de quase guerra permanente, para forçar a sua queda e a emergência de um regime iliberal. Partidos como o PSD e o PS são fundamentais para estabilização da vida política, pois a sua moderação permite que uma franja significativa do eleitorado possa votar ora num ora noutro, sem que isso implique um compromisso forte e identitário como uma dada corrente política. A estratégia dos partidos extremistas e radicais - hoje em dia, acantonados à direita - é quebrar o centro e obrigar as pessoas a definirem-se numa lógica de exclusão, ou nós ou eles. Isto é o pior que pode acontecer para a saúde de uma democracia liberal e de um Estado de direito. Chegados ao poder, as regras do jogo são subvertidas como se pode ver na Hungria, na Turquia e ainda na Polónia, onde a vitória dos liberais parece não ser suficiente para restaurar o Estado de direito e o carácter liberal da democracia.

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

As revoltas agrícolas

As revoltas agrícolas na União Europeia (UE) - não é apenas em França que os agricultores estão em pé de guerra - são um sinal dos equívocos em que a UE navega e que parecem ser combustível para a sua destruição, enquanto vão alimentando o crescimento da extrema-direita. Uma visão económica ultra-liberal e uma rigorosa regulação burocrática do combate às alterações climáticas parecem ser as causas do actual descontentamento. Os agricultores europeus estão sujeitos a objectivos de protecção ambiental exigentes. Isto deriva da regulação da UE. Por outro lado, a ideia de mercados abertos conduz a que os agricultores Europeus estejam sujeitos a uma concorrência desleal proveniente de países onde as regras de protecção ambiental, caso existam, são muito menos severas. 

Nas sociedades avançadas, a percentagem de pessoas que dependem directamente da agricultura é diminuta. Isso poderá ter induzido os responsáveis da UE a negligenciar os interesses dos seus agricultores. Representam poucos votos. No entanto, estão a cometer um erro. O peso simbólico do mundo agrícola é muito maior do que o seu peso eleitoral e tem capacidade de mobilizar a simpatia pelas suas causas muito para além das zonas agrícolas. Há duas coisas que a UE parece não estar a compreender. O dever de protecção dos seus cidadãos é fundamental em qualquer comunidade política. Em segundo lugar, o combate pelo ambiente terá de ser feito com os agricultores e não contra os agricultores. Isso implicará que a sociedade, no seu todo, contribua para auxiliar o mundo agrícola a adaptar-se às exigências do combate contra a degradação ambiental.