terça-feira, 25 de junho de 2019

A crise nas democracias

Os sinais de uma catástrofe política amontoam-se nas democracias (ver aqui). Os responsáveis observam-nos, emitem alguns sons incompreensíveis e tudo fica na mesma, isto é, continua-se a corrida para o abismo. Talvez na história política existam processos que não se conseguem evitar, como se existisse uma entidade metafísica - um espírito do mundo - que, independente do assentimento dos homens, empurrasse a realidade para um desvão onde ninguém quer viver, mas que parece ser o destino que a todos espera. A explicação não é razoável, mas muito do que se passa na vida dos seres humanos é pouco ou nada razoável.

sábado, 22 de junho de 2019

Princípio de realidade

Agora que a legislatura se aproxima do fim, já se pode perceber qual foi a inovação essencial introduzida pela actual opção governativa. A grande inovação centra-se no facto de BE e PCP, apesar de dizerem que não, trem acabado por entrar para o consenso europeu. Durante este tempo todo não puseram uma única vez em causa, de forma séria, as políticas de austeridade e as regras do tratado orçamental, e nenhum orçamento que votaram pôs em causa essas regras e essa política. Pelo contrário. Nisto, não foram diferentes do Syriza grego e da sua experiência governativa. Parece que toda a gente se curvou ao princípio de realidade.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Exportação da democracia

Mohammed Morsi é um exemplo claro dos equívocos das chamadas primaveras árabes. A queda de Hosni Mubarak pela contestação das ruas levou a umas eleições democráticas em que Morsi é eleito. Mas chega ao poder trata de encontrar meios de se perpetuar e agir acima da lei ou de conformar a lei ao seu gosto. A democracia serviu-lhe como meio para a eliminar. Foi deposto por um golpe militar. Condenado à morte, pena transformada em prisão perpétua, acabou por morrer de um acidente cardíaco durante um interrogatório. Todas as ilusões da exportação da democracia têm na figura de Morsi (e daquilo que o rodeia) o mais claro desmentido. A democracia não é uma mercadoria que se exporte. Necessita que se desenvolva uma cultura que a suscite e a proteja quando ela se instala, coisa que, claramente, não havia no Egipto.

segunda-feira, 10 de junho de 2019

O nosso espírito liberal

Eu pensava que um país civilizado era aquele em que os políticos deixavam que cada um tivesse as suas crenças e se abstinham de dar às pessoas o que quer que fosse para acreditar. Depois de ler a oração de sapiência de JMT, descobri que tenho de ir pedir ao Costa que me dê alguma coisa em que acreditar. Portugal tem um longo contencioso com o espírito liberal.

10 de Junho

Já vi aqui encómios e vitupérios ao discurso do JMT. Fui lê-lo. Apenas o expectável tendo em conta a personagem. O meu problema, porém, não é com o discurso mas com o próprio dia. O 10 de Junho nasceu como feriado municipal de Lisboa, durante os fervores da primeira República, em que esta liquidou uma série de feriados religiosos e deu permissão aos municípios para criarem o seu feriado. O Estado Novo nacionalizou-o, denominou-o dia da raça e louvou-se insistentemente nele. A democracia fez do 10 de Junho um dia pitoresco, na melhor das hipóteses. Por mim acabava com ele, devolvia um feriado à Igreja e, se se quer comemorar ritualmente Portugal, sempre podemos usar o 1.º de Dezembro (o da libertação dos Filipes) ou, de preferência, o 5 de Outubro, dia do Tratado de Zamora, pelo qual nos tornámos independentes. Neste caso, contentavam-se republicanos e monárquicos.

quinta-feira, 6 de junho de 2019

Equívoco social-democrata

Li há pouco, na caixa de comentários de um jornal, uma crítica indignada de um leitor à notícia de que os sociais-democratas dinamarqueses tinham ganho as eleições e a esquerda voltava ao poder. Manipulação jornalística. O facto de existir em Portugal um partido denominado social-democrata, alinhado ao centro-direita, cria confusões destas. A social-democracia sempre foi de esquerda e os partidos sociais-democratas foram na sua origem partidos operários. O partido comunista russo - esse mesmo, o de Lenine - resultou de uma cisão dos sociais-democratas. Em Portugal o partido social-democrata é o PS e não o PSD, mas mesmo o PS tem uma origem social muito diferente dos seus congéneres sociais-democratas, socialistas e trabalhistas. Estes nasceram como partidos operários, o PS nasceu como partido da burguesia liberal - no sentido das profissões liberais - com tiques jacobinos provenientes da primeira república. Na verdade, nunca houve em Portugal uma verdadeira corrente social-democrata no sentido tradicional, com influência real nos sindicatos, como se encontra em Espanha com PSOE, por exemplo.