A entrevista com a historiadora Rita Almeida de Carvalho (aqui) toma posição, do ponto de vista da sua disciplina, sobre se houve ou não fascismo em Portugal. Entre os historiadores não há consenso, embora aqueles que defendem a existência de fascismo em Portugal são, por norma, oriundos da resistência ao regime de Salazar e Caetano. Podemos considerar a designação de fascista aplicada ao regime que caiu em 1974 a partir de dois jogos de linguagem. O jogo da linguagem científica e o jogo da linguagem política. Do ponto de vista científico, considerar o regime de Salazar e Caetano como fascista é inadequado. Como Rita Almeida de Carvalho faz notar o regime autoritário português não preenche as condições necessárias para cair na classificação de regime fascista. A entrevista explica porquê e merece ser lida. O fascismo era um regime revolucionário, deslumbrado pela técnica e assente na indústria, um regime de mobilização total da população para os desígnios do líder. O regime português era reaccionário, ruralista, indiferente à técnica e à indústria, e apostada não é mobilizar as massas, mas em desmobilizá-las (a minha política é o trabalho). Havia coisas comuns, mas tecnicamente o salazarismo, apesar de algumas organizações para-fascistas, não era fascista. Do ponto de vista do jogo de linguagem política, é admissível, porém, chamar fascista ao regime de Salazar. É uma hipérbole, mas as hipérboles têm a capacidade de, pelo exagero, mostrar o negativo e o intrinsecamente inaceitável que havia no regime. É compatível chamar ao regime de Salazar fascista, no âmbito do combate político, e negar essa classificação do ponto de vista científico. As regras do jogo da linguagem política não são as mesmas que as regras do jogo da linguem científica, seja da História ou da Ciência Política. A primeira visa a acção, a segunda o conhecimento. O que é permissível numa, pode ser epistemicamente inaceitável na outra.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.