José Pedro Teixeira Fernandes, investigador na área das relações internacionais e colunista do Público, dá uma interessante entrevista ao mesmo jornal (ver aqui) motivada pela publicação do seu novo livro O Fim da Paz Perpétua: Geopolítica de um mundo em metamorfose. O autor refere que se está num ciclo político pouco favorável aos ideias kantianos e à paz perpétua. A entrevista centra-se na factualidade empírica da evolução do mundo e das democracias liberais. Contudo, há um portal pelo qual vale a pena e perceber, de um outro ponto de vista, a crise que os regimes democráticos atravessam, tanto na sua capacidade de atracção dos povos para novas democracias, como na sua vida interna. Trata-se da crise do Iluminismo, movimento onde se inscreve o pensamento kantiano e a ideia, também kantiana, de paz perpétua.
A aliança entre o Iluminismo e o liberalismo criaram um movimento, em primeiro lugar, de secularização do Estado - o que foi essencial para evitar as guerras religiosas - a qual, de seguida, originou o crescimento se não do ateísmo pelo menos da indiferença religiosa. Este efeito é paradoxal, pois tanto o Iluminismo como o liberalismo, apesar de podermos encontrar autores nestas áreas marcadamente ateus e anticristãos, são uma emanação de ideias que germinaram e amadureceram no cristianismo.
O corte das democracias liberais - em nome da secularização - com os valores e interpretação cristã tem vindo a escavar essas democracias, pois elas dependiam, apesar de se estruturarem em valores aparentemente não cristãos, da cosmovisão cristã que persistiu muito para além do domínio político da Igreja. O problema central das democracias liberais não é tanto a incompatibilidade crescente entre instituições democráticas estáveis e abertura ao mundo e ao cosmopolitismo, como salienta Teixeira Fernandes. Este problema, um problema real, põe-se porque deixou de existir uma cosmovisão partilhada que sustenta a legitimidade do poder político.
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