sábado, 28 de novembro de 2020

O congresso do PCP

Um dos equívocos que corre por aí relativamente ao congresso do PCP é aquele que se manifesta na indignação pela excepção que os políticos têm de se deslocar, enquanto as pessoas estão confinadas. Na verdade, a excepção dos políticos é uma excepção acompanhada por muitas outras. As pessoas que vão trabalhar, por exemplo, podem deslocar-se entre concelhos. Há mais. Um congresso político, qualquer que seja o partido, não é uma festa, é trabalho político, por vezes duro e desagradável. Aliás, qualquer congresso político deve ser uma chatice inenarrável, embora quem participa nele esteja legitimamente convencido de que cumpre um dever.

Contudo o problema nem é esse. A actividade política é diferente de todas as outras e por isso tem de se regular por normas diferentes. Difere em quê? No facto da acção política ser a condição de possibilidade de todas as outras. Sem acção política toda a sociedade colapsa. Por isso, ela nunca pode ser suspensa. Numa democracia, não pode ser suspensa a actividade do governo, do presidente, mas também não pode ser suspensa a dos partidos. Se o fosse, então estaríamos numa ditadura. Gostemos ou não do congresso do PCP, ele é uma prova viva de que vivemos em democracia. Faz parte da diferença inultrapassável que inevitavelmente separa a política de qualquer outra actividade.

Um outro problema é se o PCP ganha ou perde politicamente com a realização do congresso nesta data. Não faço ideia. Não conheço os objectivos desse partido que o levaram a organizar o congresso. Em abstracto pode-se dizer que se o congresso realiza ou contribui para a realização desses objectivos que desconheço, então o PCP ganhou ou ganhará alguma coisa. Se o congresso for um obstáculo para a realização desses objectivos, então o PCP perderá alguma coisa. Isso, porém, é um problema do PCP.

Os cidadãos devem indignar-se porque um partido político realiza um congresso e mantém, desse modo, a sua actividade política? Julgo que essa indignação é um equívoco. Mais, julgo que deveriam indignar-se com os partidos que suspendem a sua actividade normal (devidamente supervisionada pelas autoridades de saúde), enquanto as pessoas têm de ir trabalhar, de ir para as escolas, de ir para os hospitais, etc. Um partido suspender a sua actividade política pode mesmo ser um desrespeito pelos seus representados. As pessoas podem não querer compreender, mas toda a sua vida e todos os seus interesses dependem da actividade política e do seu normal funcionamento. Se se suspendesse a actividade política, tudo colapsaria a um ritmo inimaginável. A política não é uma actividade como as outras. É aquela que permite que todas as outras existam dentro da ordem e da lei.

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